Antiinflamatórios não-esteróides
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Os antiinflamatórios não-esteróides (AINEs) são um grupo variado de fármacos que têm em comum a capacidade de controlar a inflamação, de analgesia (reduzir a dor), e de combater a hipertermia (febre) [1].
Fazem parte deste grupo medicamentos muito conhecidos, em parte por alguns já estarem disponíveis há muito tempo, por serem de venda livre (MNSRM), e pelo vasto número de situações em que são usados. Alguns nomes sonantes incluem o ácido acetilsalicílico (Aspirina), ibuprofeno (Brufen®) ou paracetamol (Ben-U-Ron®).
O paracetamol, embora possua um mecanismo de acção semelhante e tenha efeito antipirético e analgésico [2], é praticamente desprovido de efeito antiinflamatório, pelo que não é, em rigor, um AINE.
Desde o isolamento do ácido salicílico em 1828 [3], os AINEs tornaram-se uma parte importante do tratamento da febre e da dor. Uma parte da sua popularidade deve-se a não causarem dependência ou depressão respiratória, ao contrário dos opióides. Ainda assim, não são desprovidos de efeitos secundários, sendo os mais comuns a nível gastro-intestinal.
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[editar] Mecanismo

Os AINEs são inibidores específicos da enzima ciclooxigenase (COX). A COX possui duas formas ligeiramente diferentes, designadas COX-1 e COX-2. Estas transformam o ácido araquidônico, uma substância formada a partir de lípidos presentes na membrana celular pela acção da fosfolípase A2, em dois tipos de compostos, as prostaglandinas e os tromboxanos [4]. O papel destes mediadores na inflamação e na dor, assim como em vários outros processos fisiológicos (como na coagulação), é amplamente aceite [1].
No início da década de 1990, a descoberta dos dois subtipos de COX criou expectativas quanto à criação de novos fármacos que mantivessem as propriedades dos AINEs existentes e permitissem diminuir a incidência de efeitos colaterais. A diferente distribuição dos subtipos de COX levou a que fosse colocada a hipótese de que a COX-1 seria "constitutiva", ou seja, estaria sempre presente no corpo e era responsável por funções fisiológicas importantes, e que a COX-2 seria "induzida", surgindo na resposta inflamatória. Desta forma, os efeitos colaterais dos AINEs deveriam-se à inibição da COX-1 [5].
Com o aparecimento de fármacos que inibem especificamente a COX-2, designados por coxibs (o primeiro fármaco deste grupo foi o celecoxib), foi possível constatar uma quase completa redução dos efeitos laterais a nível gastro-intestinal. Contudo, alguns estudos vieram colocar em causa o fundamento desta abordagem, ao demonstrar que a COX-2 também desempenhava um papel fisiológico (protector) importante tanto no estômago como no rim [6].
A inibição destas enzimas pelos AINE na redução da febre ou efeito antipirético é causada pela inibição da formação de prostaglandina E2 pela COX-1. Esta prostaglandina é um mediador importante para a activação do centro nervoso (no hipotálamo), regulador da temperatura corporal. Altos níveis de prostaglandina E2 em estados inflamatórios (como infecções) elevam a temperatura.
O efeito analgésico é devido à inibição da produção local de prostaglandinas aquando da inflamação. Estas prostaglandinas, se forem produzidas, vão sensibilizar as terminações nervosas locais da dor, que será iniciada por outros mediadores inflamatórios como a bradicinina.
Os efeitos antiinflamatórios também estão largamente dependentes da inibição da produção de prostanóides, já que estes mediadores são importantes em quase todos os fenómenos associados à inflamação, como vasodilatação, dor e atracção de mais leucócitos ao local.
[editar] Efeitos
Os AINEs têm três efeitos benéficos principais:
[editar] Efeitos adversos
A maioria é devida à inibição da COX-1. No estômago as prostaglandinas levam à produção de muco que protege as células da mucosa dos efeitos corrosivos do ácido gástrico.
- Dispepsia
- Hemorragia gástrica
- Em administração prolongada, risco de úlcera gástrica
- Náuseas
- Vómitos
- Alergias como urticária na pele, eritemas e até raros casos de choque anafilático
- Insuficiência renal reversível com a cessação da medicação
- Nefropatia associada aos analgésicos: irreversível, por vezes com medicação contínua com paracetamol.
- Síndrome de Reye - grave condição causada raramente pela aspirina em crianças. (A Aspirina não é aconselhada para crianças).
- A overdose com aspirina causa acidose metabólica.
[editar] Inibidores selectivos da COX-2
- Poderão ser trombóticos e causar raramente enfarte do miocárdio ou AVC.
Durante a gravidez:
Tratamento com AINEs em gestantes têm sido associados, à vasoconstrição do ducto arterioso fetal, hipertensão arterial pulmonar síndrome de hipertensão pulmonar persistente no recém-nascido) e inibição da agregação plaquetária (anormalidades na hemostasia).
[editar] Danos renais
[editar] Com a inibição da COX-1
As prostaglandinas são importantes moduladores fisiológicos do tônus vascular e equilíbrio hídrico nos rins (modulação da hemodinâmica glomerular, reabsorção tubular de sódio e água e regulação da secreção de renina).
Ocorrendo a queda do volume sangüíneo, o sistema renina-angiotensina-aldosterona renal é activado, o que contribui para vasoconstrição sistêmica com aumento na reabsorção de sódio e água na tentativa de manter a PA em níveis satisfatórios. Por outro lado, a angiotensina provoca síntese de prostaglandinas renais vasodilatadoras, que são sintetizadas mediante COX-1(presente no endotélio, glomérulo e ductos coletores renais). Na presença de AINES, e conseqüente inibição de prostaglandinas, este mecanismo protetor falha, podendo dar isquemia e com isso irreversíveis danos renais.
[editar] Com a inibição da COX-2
A medula renal é o local da maior síntese de prostaglandinas e apresenta importante expressão de COX-1 e também COX-2. A produção de prostaciclina renal, derivada da COX-2, possivelmente na vasculatura renal, contribuindo para o balanço de sódio, apresentando importante papel na homeostase hidroeletrolítica. Novos relatos apontam para possível ação da COX-2 na filtração glomerular. PGs medulares intersticiais podem modular reabsorção de soluto e água também através de efeitos diretos na absorção de sódio no ramo ascendente da alça de Henle e ducto coletor. A perda do efeito inibitório tônico da PGE2 (derivada da COX-2) na reabsorção de sódio em tais segmentos pode contribuir para a retenção deste íon e conseqüente falha a terapêuticas anti-hipertensivas.
Retardo na cicatrização de úlceras gástricas com os ICox-2:
Diante de úlceras gástricas pré-existentes, observou-se maior expressão de COX-2 nas células epiteliais do estômago, induzindo a formação de prostaglandinas, dentre elas a PGE2, que contribuem para a cicatrização destas lesões.
[editar] Usos clínicos
- Analgésia principalmente se a causa é inflamatória:
- Dores de cabeça
- Dismenorreia primária e menorragia (ambos oriundos do aumento de prostaglandinas)
- Dores das costas
- Pós-cirurgica
- Acção Antiinflamatória:
- Artrite reumatóide
- Gota
- Qualquer outra condição inflamatória dolorosa.
- Febre alta: as temperaturas acima de 40ºC são perigosas. São usados para diminui-la (qualquer individuo com febre acima de 40ºC deve consultar o médico imediatamente). As prostaglandinas são conhecidas por mediarem o desenvolvimento da febre.
[editar] Fármacos do grupo
Os inibidores não selectivos são mais antigos e testados, mas o inibidores selectivos da COX-2 tem menos efeitos adversos (observados após comercialização com auxílio da farmacovigilância) e colaterais (já conhecidos).
[editar] Inibidores não selectivos da COX-2
Inibem ambas COX-1 e COX-2:
- Aspirina: ou ácido acetilssalicílico. Tem outras qualidades especificas e não partilhadas com outros membros do grupo.
- Ibuprofeno
- Naproxeno
- Paracetamol (nos EUA conhecido por Acetaminophen): pouca actividade antiinflamatória mas alto poder analgésico.
- Diclofenac
- Indometacina e Piroxicam: mais fortemente antiinflamatórios
* Observação: Pacientes que fazem uso de antidepressivos possuem maior propensão a terem um aumento no tempo de sangramento e deve-se tomar cuidado com o uso concomitante de AINES não-seletivos, assim como também anticoagulantes pelo mesmo motivo. As plaquetas armazenam cerca de 90% da serotonina circulante e com o uso dos inibidores seletivos da recaptação de serotonina e outros é de se esperar que esta concentração plaquetária de serotonina se torne menor (menos disponível às plaquetas). Como a serotonina possui atividade na agregação plaquetária, se esta estiver em menor concentração agora disponível às plaquetas e mais disponível às sinápses nervosas, o vaso lesado terá maior tempo para conter o estravasamento de sangue em caso de ruptura.
[editar] Inibidores preferenciais da COX-2
Existe uma outra classe de AINES denominada "preferenciais" para COX-2, enquadrando-se o nimesulide e meloxicam. Estes exibiram in vitro maior seletividade que in vivo para a referida enzima e não devem ser confundidos com os "seletivos".
[editar] Inibidores seletivos da COX-2
Alguns autores denominam esta classe de antiinflamatórios com "específicos", mas na realidade eles podem também interagir com a COX-1, embora em baixissima escala. Portanto a denominação mais coerente é a que tem sido adotada atualmente: "Seletivos" pois não são específicos, mas tem maior afinidade por interagir, por se "encaixar" nos sítios de ligação da ciclo-oxigenase 2.
Alguns inibidores da COX-2 foram recentemente retirados do mercado voluntariamente devido a receios que fossem pró-trombóticos e aumentassem a probabilidade de um enfarte do miocárdio ou AVC. Estes problemas só surgem provavelmente depois de vários anos de uso continuado.
[editar] AINE e antiulcerosos
É comum observarmos a prescrição de antiinflamatórios não esteroidais associados a inidores da bomba de prótons ou anti-histamínicos h2 afim de que reduzindo a secreção gástrica ácida os efeitos diretos e indiretos do AINE sobre a mucosa gástrica sejam minimizados, uma vez que a secreção normal possa comprometer uma mucosa agora desprotegida e em contato com o AI. No entanto as condições de pH estomacal estão alteradas, portanto há de se considerar que existe repercusão também na absorção do fármaco AINE (caráter ácido fraco), comprometendo em determinado grau a eficácia do antiinflamatório.
Por que pró-trombótico?
Deve ser considerado que a COX-2 é essencialmente, mas não exclusivamente, inflamatória. Alguns tecidos, como renal, cerebral e pulmonar sintetizam fisiologicamente a enzima cicloxigenase-2. Esta origina a prostaciclina (PGI2), responsável pela atividade antiagregante plaquetário (papel inverso dos tromboxanos) e, uma vez que grande percentagem desta COX-2 encontra-se inibida, a concentração de prostaciclina torna-se reduzida. Uma vez que não consegue-se inibir tromboxanos em grande quantidade devido a maior seletividade cox-2/cox-1, tende-se a esperar uma redução no Tempo de sangramento, com uma coagulação mais rápida. A PGI2 é um produto das células do endotélio vascular cuja produção é ativada pela COX-2. Seus efeitos consistem em potente vasodilatação e inibição da agregação plaquetária e da proliferação de músculo liso vascular. Desta forma acredita-se que a prostaciclina é um eucosanóide antiproliferativo, e a relativa deficiência dessa prostaciclina, derivada de COX-2, pode predispor aterogênese.
Por que usar AINES seletivos?
A maior vantagem do uso dos AINES Seletivos é a baixa possibilidade de irritação de mucosa gástrica, uma vez que não inibe substancialmente a COX-1 que originará a PGE2, responsavel pela mucoproteção gástrica, como ocorre nos não seletivos. No entanto estudos têm demonstrado que a administração dos seletivos em pacientes portadores de úlceras gástricas ativas pode retardar a cicatrização destas, uma vez que a inibição da atividade da COX-2 também influencia na cicatrização das úlceras estomacais. *Alguns autores já relatam também o desenvolvimento de úlceras com AINES seletivos tomados por grandes períodos de tempo.
Exemplos de medicamentos AINES seletivos para a COX-2:
- Celecoxib: nome comercial Celebrex.
- Lumiracoxib: nome comercial Prexige, Novartis
- Etoricoxib: nome comercial Arcoxia, Merck-Sharp
- Rofecoxib:retirado do mercado, nome comercial Vioxx.
Estes receios, mesmo que sustentados, deverão ser pouco significativos em relação aos benefícios de que alguns doentes podem usufruir com o seu uso, portanto há de se estipular o risco-benefício de se utilizar a longo prazo estas drogas antiinflamatórias (ex. tratamento paliativo da artrite reumatóide)
Com a descoberta da Cox-4 e Cox-5, e as possíveis diferenciações entre Cox-1a e Cox-1b, entre Cox-2a, Cox-2b e Cox-2c, e ainda Cox-3 com seus sub-tipos alfa e beta, não há como citar os reais efeitos de tais fármacos, já que tais enzimas foram negligenciadas nas pesquisas, o que quer dizer que nenhum dos fármacos é seguro.
[editar] Referências
- ↑ 1,0 1,1 Brunton, Laurence L., John S. Lazo, Keith L. Parker (2006). Goodman & Gilman's The Pharmacological Basis of Therapeutics, 11 ed., McGraw-Hill.
- ↑ Bertolini, A; Ferrari A, Ottani A (2006). "Paracetamol: new vistas of an old drug". CNS Drug Reviews: 12(3-4):250-75. PMID 17227290.
- ↑ Lafont, O (2007). "From the willow to aspirin". Revue d'histoire de la pharmacie: 55(354):209-16. PMID 18175528.
- ↑ Khanapure SP; Garvey DS, Janero DR, Letts LG (2007). "Eicosanoids in inflammation: biosynthesis, pharmacology, and therapeutic frontiers". Current Topic in Medicinal Chemistry: 7(3):311-40. PMID 17305573.
- ↑ Süleyman H; Demircan B, Karagöz Y (2007). "Anti-inflammatory and side effects of cyclooxygenase inhibitors". Pharmacological reports: PR: 59(3):247-58. PMID 17652824.
- ↑ Bertolini A; Ottani A, Sandrini M (2001). "Dual acting anti-inflammatory drugs: a reappraisal". Pharmacological Research: 44(6):437-50. PMID 11735348.